domingo, 26 de novembro de 2017

Estou sentada em frente ao computador pensando o que escrever e vendo o quanto não sei mais nada sobre mim, o quanto não sinto mais nada. 
Antes eu estaria aqui sentada e entraria em cada entranha minha, trazendo toda a dor e sofrimento a tona, fazendo brotar cada amargura mas não as acho mais.
Antes eu estaria aqui e descreveria cada alegria de forma quase palpável, te diria como o orvalho da manhã foi a sensação de "deus" e no fim você também sentiria, mas não consigo descrever mais nada como igual a presença do divino. 
Será que estou morta a tanto tempo que não sinto, me belisco e constato que não há nenhum sentimento, cheguei então ao vazio. 
Não sentir é ainda pior que ter todos os sentimentos a flor da pele, ainda assim é necessário seguir em frente e por isso o vinho em meu copo desce ainda mais amargo.

segunda-feira, 15 de maio de 2017

Quando te vi achei que nossos passos estavam unidos, lado a lado a vida inteira. Você também acreditou nisso e desde então todo passo a frente é um passo ao teu encontro, ao teu caminho, é um retorno de onde partimos. 
Ao nos encontrarmos o que fica para trás é um rastro de destruição, misto de expectativa e decepção, nem notamos que assim como nossos destinos cismam em cruzar também nos repelem. 
E eu fico aqui procurando em todo passo seu rastro, você fica em todo abraço procurando meu afago e no final a gente se afasta, vive assim de meio amor em meio amor até que a vida canse.
Até que então não nos sobre nenhuma opção, que nosso destino até então traçado se separe em meio a frase "até que a morte os separe", que nunca foi dita a todo pulmão mas sempre foi selada por nós.

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

- Bem Betina como foi sua última semana?
Ao fundo o relógio batia tão lentamente que o tempo parecia parado e aqueles quarenta e cinco minutos ali uma eternidade, dentro da mente a única pergunta era "como poderia a eternidade caber dentro de nem uma hora e essa eternidade ser tão incomoda"
- Oi? O que o senhor me pergunto? Desculpe!
- Eu te perguntei da semana, se tivemos algum progresso ou alguma lembrança e quem sabe algum desenho como semana passada.
- Bem não, nenhum desenho, foi uma semana bem calma na vida de... Digo na minha vida, faculdade para a casa, cama para a faculdade novamente. E teve o Roger, meu deus ele é tão estranho, me levou em uns lugares que bem ...
O silêncio entrou devagar no ambiente, como se tivesse vindo pela própria porta, tanto que até Betina olhou a respiração lenta e pausada e por fim a frase
- Bem ele insiste que eu gostava, mas eu não sei se pode ser verdade.
- Eu entendo, tudo isso é novo para você são apenas dois meses e acredito que aos poucos você irá se lembrar das coisas com um pouco mais de clareza e esses lugares vão fazer algum sentido e você se sentirá em casa.
- É, casa... - pronunciou bem baixinho, mas o que era casa para ela se afinal nem mesmo a sua imagem fazia sentido, se casa era o corpo que corpo estranho era aquele que habita, aquelas tatuagens que se significavam algo agora não faziam sentido nenhum, casa não deveria ter família, mas se não sobrou ninguém onde é que se acha a casa? Quantas perguntas que ela e muito menos ele responderiam.
- Bem Betina, por hoje é só e te espero semana que vem no mesmo horário.
Abriu a porta e quase respirou aliviada por ter ido mais um dia, porém lá estava ele sentado na recepção com um sorriso estampado de esperança que ela poderia ter lembrado dele e então retornassem da onde pararam "o casamento, a viagem para paris, as crianças pela casa e os cachorros no quintal", mas ao desviar rapidamente o olhar do dele ele soube, não era possível retornar a lugar nenhum. Era uma completa desconhecida que dividia a cama com ele, o apartamento, a vida que antes fazia tanto sentido juntos agora só lhe causava náuseas, tantas tentativas frustadas e nem sequer uma lembrança. Como pode, ela que o amava tanto não ter uma única memória feliz ao lado dele, nem que esse memória fosse a briga porque ela viajou com Beto para a casa da praia sem nem o convidar, ou então quando ele esqueceu dela plantada na porta do cinema porque teve que fazer hora extra. Nada, absolutamente nada!
Entraram no carro, um jeep verde que era uma das poucas coisas que Betina gostava de ter em sua nova vida, achava que a velha Betina tinha um gosto excepcional para carros, como ele era confortável e a sensação de liberdade e aventura que ele lhe causava, como se pudesse desbravar o mundo inteiro naquele carro, ir em busca somente do novo e deixar para trás tudo o que ela não podia mais viver ou lembrar, devia ser pelo seu ar esportivo e sempre que ela analisava essa teoria ria sorrateiramente.
- Você dirige hoje? - Roger cortou seus pouquíssimos segundos de alegria com o carro.
- A claro, dirijo! A chave tá na mão já. - Lá vamos nós desbravar a grande São Paulo, seus prédios e suas ruas em meio ao perigo e grafite, riu disfarçadamente para que Roger não a questionasse.
Durante todo o caminho a música no rádio, os postes passando lentamente por cima do vidro e meu deus como aquela cidade era bonita e feia ao mesmo tempo, uma rua bonita com seus grandes prédios, outras casebres e outras casas imensas pixadas de ponta a ponta. A raiva e o amor das ruas de um muro para o outro, de um prédio para o outro...
- Betina você tá indo para lá de novo!
- Nossa me desculpa eu, eu nem notei estava olhando os prédios e você... Bem você sabe mas já to pegando um retorno. Troca a pasta para mim? Deve ser isso, me distrai.
Pega o retorno, volta confusa... Ali de novo e de novo tantas vezes, nenhuma resposta e agora o tempo voava, apagava a eternidade num sopro e chegou enfim em "casa".
- Bem agora o lugar certo não é - Sorriu um sorriso desses frouxos enquanto o portão elétrico se abria.
- Sim, o lugar certo Betina - a cara amarrada, sem retribuir o sorriso demonstrando o cansaço, será que aquele lugar. Betina tinha um amante por ali, alguém que talvez ela lembrasse e amasse ao contrário dele! Afinal nenhuma lembrança dele ...
No elevador perguntas triviais do gênero "como foi, mostrou os desenhos, mentiras e mais mentiras, foi tudo bem sim, vamos dormir", mas o relógio ainda marcava 20:18 h e o longboard no canto da cozinha chamava para um passeio. Foi disfarçada até o quarto, trocou de roupa e pensou em sair sem chamar muita atenção. Fumar um, sentir de leve o vento, se arriscar por São Paulo afinal quem daria falta de alguém que não tem ninguém?

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Samba para Dom Casmurro

"Eu sempre achei que o amor,
Que o grande amor, fosse incondicional.
Que quando duas pessoas se encontram, que quando esse grande encontro acontece, você pode trair, brochar, dar todas as porradas, se for um grande o amor, ele voltará triunfal. 
Sempre!
Mas não, nenhum amor é incondicional.
Então acreditar na incondicionalidade do amor, é decididamente precipitar o fim do amor, porque você acha que esse amor aguenta tudo, então de um jeito ou de outro você acaba fazendo esse amor passar por tudo, e um amor não aguenta tudo, nada nesse vida é assim!
E aí você fala que esse amor não tem fim, para que o fim então comece. 
Um grande amor não é possível, talvez por isso seja grande. 
Então, assim, nele, obrigatoriamente, pode caber também o impossível.
Mas quem acredita? 
Quem acredita no impossível, que não apaixonadamente? 
Como a um deus, incondicionalmente."






terça-feira, 27 de outubro de 2015

Beto nº 1

Quando a história de Ana aparentemente chega ao fim é que nós olhamos e entramos mais atentamente na história e vida de Beto. A partir daquele momento caro leitor você ganha o direito de abrir enfim a porta do apartamento dele, investigar com quem ele se deita e também o quanto sua vida pode mudar.
Ana jamais vai deixar de existir para nós, principalmente se julgarmos que sua história estará eternamente entrelaçada na história de Beto mesmo que ele venha a jurar "até que a morte nos separe" a outra garota ainda haverá um pouco de Ana em cada passo ou no parque, em cada perfume na rua ou em cada cabelo loiro que o vento bagunça, como se quando aquela garota virasse o sorriso pudesse ser o de Ana.
Porque um amor assim sempre ultrapassa alguma coisa e entra em outras histórias, invade outras vidas que na verdade nunca se tocaram pessoalmente e com essa não seria diferente.
De agora em diante Beto escreve sozinho o sentimento que a maioria de nós tentaríamos apagar aos poucos e se torna uma saudade, que as vezes o faz chorar e outras rir. Logo os livros são transferidos de prateleira, passando assim da organização perfeita de Ana para a gaveta da sala dele, tudo assim empilhado e apertado para caber.
Agora ele que está sentado no sofá da sala, uma garrafa de cerveja na mão e algumas no chão pensando se daria conta de ler tudo ou se ela leu mesmo tudo como falava. Parecia que sim, pois todos tinham a marca de unha dela grifando frases que eram consideradas interessantes ou então a marca do esmalte vermelho que as vezes batia no livro e marcava a página num risco quase impossível de ver que para ele era um breve momento de alegria.
As vezes quando ele dormia também esquecia tudo o que tinha lido o que tornava ainda mais difícil aquela missão que ele havia se comprometido, as vezes desejava que Ana tivesse deixado um gato para cuidar ou um cachorro para passear, mas não que fossem ruim os livros é somente que aquele era um hábito muito mais dela que dele.
Agora que já conhecemos a sala podemos invadir um pouco mais o apartamento dele e também sua privacidade, muito mais organizado era o quarto se comparado a sala. Havia uma mesa de trabalho com alguns desenhos e rabiscos para as tirinhas do jornal em que ele trabalhava, um notebook e uma gaveta que só era aberta  com a chave que ficava escondida em outra parte do quarto que não vou contar, afinal invadiríamos demais a privacidade dele assim.
Mas conto para vocês um detalhe do que está dentro da gaveta, é um caderno que vocês devem saber a quem pertenceu antes...
Sim, era dela ! 
O começo era escrito por ela com poemas, bobeiras, cotidiano, sonhos, horóscopo, mas sobrou um espaço para ela gravar também as coisas dele que eram principalmente para ela. Quem saiba ele esqueça o livro aberto e eu possa mostrar a vocês uma história um dia.

segunda-feira, 9 de março de 2015

Carolina nº 3

Carolina era diferente assim desde criança, seus pais a criavam como uma menina que gostava de bonecas mas era só tirar os olhos que ela logo metia um soco na meninada e soltava um palavrão.
De cara parecia fofa, nasceu careca e sem dente algum mas logo que pode fez a fama de macho e sapata na escola, a sexualidade era definida como "indefinida", afinal Carol gostava de meninos ou meninas ?
Cresceu devagar aos olhos da mãe e muito rápido aos olhos do pai que se separou logo quando ela era ainda criança, surgiu rápido a primeira tatuagem e em um mês a segunda, logo a oitava ou a décima.
Tinha um emprego maneiro mas era gananciosa, queria uma vida para chamar de suas e histórias para contar que não cabiam na casa da mãe, que por sinal achava muito parada e chata.
A primeira proposta de dinheiro fácil era vender drogas para um amigo mas aos quinze anos aquilo não fazia sentido nenhum.
Porém aos vinte e cinco anos quando falaram que era só "amor" por dinheiro tudo ficou mais fácil, afinal na mente de Carolina o amor não era coisa séria, tinha visto anos e anos de traições do seu vô e sua vó que resultaram em filhos de outras pessoas, também havia pegado seu pai num puteiro aos dez anos quando sua mãe  estava enfurecida no sábado e no domingo havia um grande almoço em que nada parecia ter acontecido.
Mas não era possível que a mente de Carol seria tão traiçoeira e criaria tão nitidamente segurar na mão de sua mãe e entrar num lugar cheio de meninas semi-nuas, algumas tão novas de "bíquini" preto e uma delas segurava um copo na mão que anos depois lhe pareceu uísque. Sua mãe entrou rápido e segurava sua mão, acabava de chegar de viagem e foi direto parar ali.
Sua mãe pegou logo o copo da menina e tacou  no pai de  Carolina o mais forte que pode, foi como se tudo que ela olhasse nos filmes infantis acabassem ali e muitos anos depois fez com que sua concepção de amor se tornasse em mercadoria de troca, não em frascos mas sim como a moça de preto se vendia ao seu pai tão facilmente, logo notou que não seria nem de perto sua mãe maluca de amor e sim a moça bonita no balcão que sempre soube que tudo era falsidade e logo pode ganhar o dinheiro que precisava como as outras mães ou esposas tanto odiavam, colocava quase sempre a roupa preta e se lembrava da moça no balcão em sua melhor postura "forte, confiante e determinada" até tirar o último tustão ou suspiro de seu "cliente" e no outro dia ia para o emprego miserável que parecia o de sua mãe e ficava enojada daquilo.

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Beto nº 2

No caderno de Beto, ainda nas primeiras páginas eu pude ver o texto escrito e tive dó da confusão que lhe causei ao leva-lá, mas como todos sabem era necessário e de certa forma inevitável. Estava assim no caderno:

Textos para Ana

Eu não entendo nem por um instante o espaço que se fez. Era mesmo necessário que você partisse dessa forma sem deixar um único recado ou carta. E agora o que eu faço?
Devo te amar ainda ou sentir raiva porque nesse momento ambos sentimentos vivem a se misturar e nem por um instante eu consigo entender porque tudo foi assim. 
Queria muito que estivesse aqui hoje quando ela me contou tudo, mas acho que se você estivesse aqui nada disso estaria acontecendo, certo?